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EUA

Hollywood acarinhou Obama e o que vai ter em troca?

O espectáculo americano poderá ficar desapontado quanto a uma relação de trabalho com o Presidente.
As estrelas são atraídas por outras estrelas, e o magnetismo Obama foi especialmente forte: Hollywood acorreu em força a participar na campanha de Barack Obama, com vídeos na Net e mensagens de apoio, e as estrelas estiveram em peso em Washington, na posse do novo Presidente.
As filhas do casal Obama conheceram Beyoncé no baile da tomada de posse. Mas tal como Michelle Obama já prometeu que não quer que as filhas convivam com celebridades, as estrelas da música e do cinema deverão estar também mais ausentes da Casa Branca, pelo menos mais do que o que foi hábito com o último Presidente democrata, Bill Clinton. O site norte-americano Politico comentava que Obama "parece estar bem consciente dos perigos de estar demasiado perto das personalidades do showbiz", tendo passado "relativamente pouco tempo a cortejar o establishment político de Hollywood".
Pode argumentar-se que não precisaria, porque uma parte das estrelas assumiu a iniciativa de o apoiar. Mas também se pode dizer que esse apoio poderia servir simplesmente como munição para os adversários: afinal, o adversário de Obama, John McCain, atacou-o precisamente por atrair multidões "como uma estrela pop", comparando-o a Paris Hilton (como descrever Paris Hilton? Uma celebridade?) e a Britney Spears. O que levou a um episódio hilariante com Paris Hilton a aparecer num vídeo apresentando-se como candidata à presidência, folheando uma revista de viagens para decidir onde conseguir o melhor bronzeado antes de explicar o seu plano para acabar com a dependência energética dos EUA.Mudança de ritmo
A vida na Casa Branca deverá mudar - o ritmo da equipa Obama é mais workaholic, o de Bush era menos frenético. Na Casa Branca de Bush todos se deitavam às dez da noite e a vida social era mínima - Bush deu 12 jantares oficiais em oito anos, contra os 30 de Clinton e 50 de Reagan, lembra um artigo no jornal Estado de São Paulo. Obama deverá ficar entre a frugalidade de Bush e a grande actividade social de Bill Clinton, onde não era raro aparecerem convidados como Barbra Streisand, Steven Spielberg, Jane Fonda ou Tom Hanks.
Obama tem começado a trabalhar pouco antes das nove da manhã, depois de fazer exercício físico por volta das 6h45. Bush começava duas horas mais cedo, mas preferia uma pausa para actividade física a meio do dia, diz o New York Times. O novo Presidente irá tomar o pequeno-almoço com a família antes de começar o dia de trabalho, e jantará com a mulher e as filhas. Mas o diário norte-americano adiantava que com apenas uma semana no cargo já se percebia que não será raro vê-lo às dez da noite ainda na Sala Oval a ler briefings para o dia seguinte.
Quanto à vida cultural, os cantores country, que eram os artistas mais frequentes na casa da Pennsylvania Avenue no tempo de Bush Jr., deverão dar lugar a outro tipo de músicos - o gosto de Obama é variado, no iPod tem desde Bob Dylan a Jay-Z, de Sheryl Crow a Stevie Wonder - mas a Casa Branca de Obama não deverá registar uma reviravolta como a que aconteceu com os Kennedy: os anos de JFK ficaram marcados por uma vida cultural refinada como nunca até então (há até uma compilação em CD Music of the Kennedy White House, com faixas de artistas desde o virtuoso violoncelista Pablo Casals até cantoras como Mahalia Jackson ou Ella Fitzgerald, e faixas de compositores como Leonard Bernstein ou Aaron Copland, duas presenças frequentes na Casa Branca dos Kennedy.)Um ministro da Cultura?
Hollywood apaixonou-se por Obama. No espírito de "todos podemos fazer um pouco", muitas estrelas gravaram e puseram on-line algumas promessas - no myspace.com/presidentialpledge pode ver-se Courtney Cox a comprometer-se a ajudar a acabar com a fome na América, Eva Mendes a prometer dar mais tempo para ajudar crianças com doenças graves, entre muitos outros (e numa nota de humor Anthony Kiedis, dos Red Hot Chili Peppers, promete lealdade ao funk. Bem, um pouco à frente e mais a sério, promete ajudar mais os idosos americanos).
De certo modo Hollywood encontrará no novo Presidente alguém atento a algumas questões caras às estrelas, da ecologia ao Darfur, passado pelo sistema de saúde. E Barack Obama já fez algumas afirmações e promessas que agradaram ao mundo das artes, como a criação do Art Corps, semelhante ao Peace Corps, onde se alistam pessoas que se oferecem para fazer voluntariado em qualquer parte do mundo - no Art Corps os voluntários poderiam ajudar nas escolas e organizações de arte pelo país.
Mas, alerta o Politico, algumas ideias não são tão caras à nova Administração. É o caso da criação de um secretário das Artes, equivalente a ministro da Cultura, e do aumento de verbas para esse pelouro, ou da criação de um grupo de celebridades que agiriam um pouco como os embaixadores de boa vontade das Nações Unidas.
No primeiro caso, diz o jornal dedicado à política norte-americana, o aumento de verbas para as artes foi uma arma de ataque que os conservadores estiveram sempre prontos a usar contra os democratas. E em tempo de crise poderá ser difícil justificar o aumento de uma fatia do orçamento que tem vindo a diminuir nos últimos anos, assim como a criação de um posto que espelhasse esta importância das artes.Quanto à ideia dos embaixadores, explica o Politico, o medo será que as ideias demasiado liberais dos embaixadores-estrelas se sobreponha aos compromissos moderados de Obama.
Mas há quem espere que a maior contribuição de Obama venha pelo exemplo. O especialista em Artes do Christian Science Monitor Roland Kushner, que é professor no Muhlenberg College (Pensilvânia), sugere ao Presidente que envolva a família, especialmente as filhas, em actividades culturais: "Leve Malia e Sasha ao museu, ou mostre-as a ter aulas de música na Casa Branca."

08.02.2009 - Maria João Guimarães, Ípsilon, Público