Revolução acabou com 48 anos de fascismo em Portugal.
O levantamento militar do dia 25 de Abril de 1974 derrubou, num só dia, o regime político que vigorava em Portugal desde 1926, sem grande resistência das forças leais ao governo que cederam perante o movimento popular que rapidamente apoiou os militares. Este levantamento é conhecido por 25 de Abril ou Revolução dos Cravos. O levantamento foi conduzido pelos oficiais intermediários da hierarquia militar (o MFA), na sua maior parte capitães, que tinham participado na Guerra Colonial. Considera-se, em termos gerais, que esta revolução devolveu a liberdade ao povo português (denominando-se como "dia da Liberdade" ao feriado instituído em Portugal para comemorar a revolução). Portugal passou por um período conturbado que durou cerca de 2 anos, marcados pela luta entre a esquerda e a direita. Foram nacionalizadas as grandes empresas. Passado um ano realizaram-se eleições constituintes e foi estabelecida uma democracia parlamentar de tipo ocidental. A guerra colonial acabou e as colônias africanas tornaram-se independentes antes do fim de 1975.
À 0h20 do dia 25 de abril de 1974, a Rádio Renascença, de Portugal, tocou uma música proibida: Grândola, Vila Morena, de Zeca Afonso. Era a senha para o início do movimento dos capitães, que ficou conhecido como a Revolução dos Cravos. Após 48 anos de ditadura, Portugal estava voltando a ter um regime democrático. O movimento aparece para os portugueses com um programa que se definia por três Ds: Democratização, Descolonização e Desenvolvimento. A revolta militar foi uma consequência dos 13 anos de guerra colonial, em que os portugueses enfrentaram os movimentos de libertação nas suas colônias: Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, Cabo Verde, São Tomé e Príncipe e Timor Leste.
A decadência económica de Portugal e o desgaste com a guerra colonial provocam descontentamento no interior das Forças Armadas. Em 25 de abril de 1974 eclode a Revolução dos Cravos: oficiais de média patente se rebelam e derrubam o governo de Caetano, que se asila no Brasil; o general António de Spínola assume a Presidência. A população festeja o fim da ditadura distribuindo cravos - a flor nacional - aos soldados rebeldes. Os partidos políticos, inclusive o Comunista, são legalizados e é extinta a Pide, polícia política do salazarismo. O novo regime mergulha Portugal numa agitação revolucionária: Spínola fracassa em sua tentativa de controlar a força política e militar da esquerda e renuncia em setembro de 1974; o governo passa a ser dominado pelo Movimento das Forças Armadas (MFA), fortemente influenciado pelo Partido Comunista. Angola, Moçambique, Cabo Verde e Guiné-Bissau obtêm a independência. Em março de 1975, após uma fracassada tentativa de golpe de Spínola, o governo passa a ser dominado por um triunvirato formado pelos generais Costa Gomes, Otelo Saraiva de Carvalho e Vasco Gonçalves. Tem início uma política de estatização de indústrias e bancos, seguida por ocupações de terras. O moderado Partido Socialista, de Mário Soares, vence as eleições para a Assembleia Constituinte em abril de 1975. Em novembro do mesmo ano, o fracasso de uma tentativa de golpe de oficiais de extrema esquerda põe fim ao período revolucionário. Apesar disso, a Constituição de 1976, ainda influenciada pelo MFA, proclama a irreversibilidade das nacionalizações e da reforma agrária. Em 1976 o general António Ramalho Eanes, comandante das forças que esmagaram a rebelião de oficiais esquerdistas, é eleito presidente da República; os socialistas conquistam 35% dos votos e Mário Soares forma um governo minoritário. A luta do povo português contra o fascismo e a guerra colonial tornou-se um poderoso movimento de massas, abrangendo praticamente todas as classes e sectores da vida nacional. Nos últimos meses de 1973 e nos primeiros de 1974, antecedendo imediatamente o 25 de Abril, o movimento popular de massas desenvolvia-se impetuosamente em todas as frentes. A primeira grande frente de luta popular contra a ditadura foi o movimento operário. A classe operária intervinha como vanguarda em toda a luta antifascista, em todo o processo da luta popular. A repressão caía violentamente sobre o movimento operário. Nunca, porém, o fascismo conseguiu liquidar e abafar a organização e a luta dos trabalhadores. Grandes greves dos operários industriais, dos transportes, dos empregados, dos pescadores, dos trabalhadores agrícolas, exerceram profunda influência no processo revolucionário.
De outubro de 1973 até ao 25 de abril, além de muitas centenas de pequenas lutas nas empresas, mais de cem mil trabalhadores agrícolas do Alentejo e Ribatejo participaram numa vaga de greves que vibrou golpes repetidos, incessantes e vigorosos no abalado edifício do regime fascista. A segunda frente de luta popular contra a ditadura foi o movimento democrático. As formas de organização e métodos de acção de massas do movimento democrático português são um exemplo brilhante da associação do trabalho legal e do trabalho clandestino nas condições duma ditadura fascista. Mantendo sempre uma grande firmeza política e de objetivos, o movimento democrático nas mais pequenas condicionais possibilidades de actuação legal e semilegal, soube encontrar formas de organização e de acção que lhe permitiram esclarecer amplos sectores e desencadear poderoso movimento de massas. A terceira grande frente de luta popular contra a ditadura foi o movimento juvenil. A juventude teve um papel de extraordinário destaque na luta contra a ditadura fascista. Os jovens (trabalhadores e estudantes) estiveram sempre nas primeiras linhas em todas as frentes da luta política, económica e cultural, na agitação clandestina, nas manifestações de rua, nas actividades de maior perigo.
A quarta grande frente da luta popular foi a das classes e camadas médias. Os intelectuais, ao longo de quase meio século de opressão, constituíram sempre uma força de oposição, participando activamente no movimento democrático e desenvolvendo toda uma ação cultural e de criação literária e artística contra o fascismo. Nos últimos tempos da ditadura, as acções dos intelectuais haviam-se intensificado. A criação da Associação Portuguesa de Escritores e os grandes movimentos dos professores do ensino secundário e dos médicos, com grandes assembleias, concentrações e greves, mostraram bem a oposição tenaz ao regime. Em todos os sectores da vida social, o povo português passara à ofensiva contra a exploração e a opressão fascistas, pelas liberdades e pela solução dos seus problemas vitais. Na situação portuguesa pesava de forma crescente a guerra colonial com todas as suas consequências. Os efeitos da guerra sentiam-se na vida económica, social e política e na situação das próprias forças armadas. A situação foi-se agravando ainda mais na medida em que os movimentos de libertação da Guiné-Bissau, Moçambique e Angola alcançaram sérios êxitos na luta armada. Por isso, nos últimos tempos do fascismo, o movimento contra a guerra colonial e as lutas nas forças armadas tornam-se um dos centros de polarização de descontentamento e de energias e adquirem uma importância cada vez maior.
É a quinta grande frente da luta popular contra a ditadura que acabará por ser determinante para lhe pôr fim. A luta contra a guerra colonial e pelo reconhecimento do direito dos povos submetidos ao colonialismo português à completa e imediata independência, tornou-se nos últimos anos do fascismo um vigoroso movimento nacional.
Adquirindo crescente amplitude e tomando várias formas, essa luta travava-se em três frentes principais: a acção política, a resistência nas forças armadas e acções contra o aparelho militar colonialista. Correspondendo à acção política, multiplicam-se as acções de resistência no seio das próprias forças armadas. Nunca numa guerra colonial o número de desertores e refratários atingiu uma cifra comparável à registrada em Portugal. Segundo alguns cálculos, o número de refratários chegou a atingir quase um terço dos jovens em idade militar. Na grande corrente emigratória um forte contingente era de jovens fugindo ao serviço militar e à guerra. A par das deserções, as manifestações de resistência nas forças armadas adquiriram um caráter cada vez mais freqüente e maciço. É nesta situação e neste ambiente que toma corpo o "movimento dos capitães" (Movimento da Forças Armadas - MFA). O "movimento dos capitães" traduz, nas forças armadas, a tomada de consciência do povo português da necessidade do fim da guerra e da pronta liquidação do fascismo. As forças armadas, que haviam sido durante quase meio século o principal apoio do fascismo, tornam-se dia a dia o apoio cada vez mais condicional e incerto. O agravamento das contradições e dificuldades do regime e o aprofundamento da crise interna, por um lado, e o vigoroso desenvolvimento da luta popular contra a ditadura e contra a guerra, por outro, indicavam que se aproximava a passos rápidos e seguros uma situação revolucionária. E ao levantamento militar sucedeu-se imediatamente o levantamento popular. No próprio dia 25, as massas populares apareceram poderosas, rodeando, acarinhando, apoiando e estimulando os militares, tomando elas próprias iniciativas de acção, fundindo o povo e as forças armadas numa mesma aspiração e num mesmo combate. Depois de quase meio século de fascismo iniciava-se a Revolução portuguesa que iria causar a surpresa e a admiração da Europa e do mundo. Em 25 de Abril de 1974 terminava, derrotada pelo Movimento das Forças Armadas - MFA e pelo povo a longa ditadura fascista de 48 anos que Salazar impôs ao povo português, ditadura tão estruturada, tão repressiva, que sobreviveu à morte do ditador ocorrida em 1970. Foi talvez a mais linda festa política dos oito séculos da história de Portugal: a multidão, milhares de pessoas em estado de júbilo, dançava, cantava, chorava, sorria. E se abraçava, e abraçava os jovens soldados sem medo dos fuzis. E ocorreu então um caso extraordinário, até hoje sem explicação. Não se sabe como nem porquê, havia cravos vermelhos nas mãos do povo. Homens, mulheres e crianças de cravos nas mãos. Milhares de cravos. E o povo enfeitou de cravos os fuzis militares. E do povo a revolução ganhou nome: Revolução dos Cravos!